A popularização de aplicativos revolucionou o cotidiano de deficientes visuais.
Por Valquíria Vieira
Segundo a Organização Mundial da Saúde, em 2020, poderão existir 75 milhões de pessoas cegas no mundo e mais de 225 milhões com baixa visão. Hoje, pessoas com alguma limitação ou perda total da função básica do sistema visual estabelecem contato digital de diferentes formas por meio de aplicativos especializados. Existem softwares de voz que permitem a acessibilidade pelo computador e os aplicativos para celular. No sistema IOS, o recurso Voice Over e no Android, o Talk Back, estão presentes nas configurações do próprio aparelho.
No entanto, ainda que exista uma norma de acessibilidade para viabilizar a compreensão de deficientes visuais, esta lei nem sempre é cumprida pelas empresas, o que dificulta acesso de muitos sites. De acordo com o documento oficial de “Boas práticas para dados na Web” produzido pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto a fim de implementar diretrizes do Comitê Gestor da Internet no Brasil, todos os sites devem disponibilizar a audiodescrição (AD), de modo que seja possível a tradução de imagens em palavras.
Em Uberlândia, existe a Associação dos Deficientes Visuais de Uberlândia, a ADEVIUDI, onde são realizadas oficinas diversas, como orientações para o uso de smartphone, pintura em tecido, fabricação de tapetes em grade e alfabetização em Braille (sistema de escrita tátil utilizado por pessoas cegas ou com baixa visão). Hoje, o foco principal da instituição é a reabilitação das pessoas com deficiência visual ou com baixa visão que são aquelas que, mesmo usando lentes corretivas, ou seja, óculos ou lentes de contato, que tenham ou não sido submetidas a algum procedimento cirúrgico ocular, não conseguem ter uma visão nítida.
Todas as atividades são gratuitas e são ofertadas semestralmente pela instituição. Para participar, os associados são adicionados no grupo do Whatsapp, a fim de possibilitar a comunicação. Além disso, o grupo utiliza diversos aplicativos assim como as ferramentas apropriadas que estão presentes nos de uso comum.
Um dos aplicativos mais indicados no Google, que também é referência no Brasil, é o "Be my eyes" com mais de um milhão de downloads por todo o mundo. Este recurso, lançado em outubro de de 2017, foi desenvolvido por voluntários que entenderam a necessidade de auxiliar pessoas com a visão subnormal ou cegos a resolver tarefas grandes e pequenas a fim de que possam levar uma vida independente.
Este aplicativo é composto por uma rede de voluntários, que podem se cadastrar para oferecer auxílio aos deficientes visuais. Esta assistência ao vivo permite que voluntários com visão emprestem, literalmente, seus olhos para uma pessoa cega. Com o “Be my eyes” instalado no celular, o aplicativo é conectado ao áudio e vídeo do aparelho em tempo real, dessa forma possibilita o contato entre usuários cegos e usuários sem deficiência visual.
"Assim que o primeiro usuário com visão aceitar a solicitação de ajuda, uma conexão de áudio e vídeo ao vivo será configurada entre as duas partes. Através da conexão de vídeo da câmera traseira do usuário cego ou com deficiência visual, o voluntário pode auxiliar o usuário cego ou com deficiência visual" conforme a descrição do aplicativo.
A presidente da ADEVIUDI, Joana Batista, explica que os aplicativos auxiliam diariamente na comunicação cotidiana entre todos. “Estes aplicativos nos ajudam muito, muito mesmo! Como o Facebook, Whatsapp e o Google Assistent, conseguimos acompanhar reportagens, acessar as redes sociais e manter contato com nossos amigos”. No entanto, ao considerar as condições financeiras dos mais de 800 associados, a presidente afirma que ainda são poucos aplicativos acessíveis.
“Existem vários outros aplicativos, mas estes são pagos ou disponibilizados apenas para os telefones mais avançados e quem é de baixa renda não consegue ter. O app que mais utilizamos atualmente é o Talk Back” afirma Joana. Este aplicativo permite a interação de deficientes visuais com as funções básicas de seu dispositivo. Por meio de palavras faladas, vibrações e outros comentários audíveis que descrevem para o usuário o que está na tela.
Heverton Rodrigues é servidor da Universidade Federal de Uberlândia e conta que teve mais facilidade para se adaptar com o auxílio dos aplicativos. “Perdi a visão aos 18 anos e a principal barreira foi me adaptar a locomoção mas, também, manter meus estudos” ele conta que foi difícil continuar na faculdade por ser estudante de um curso de exatas, porque naquela época não existiam aplicativos que permitiam a leitura de fórmulas avançadas.
Heverton conta que tem acesso às mídias digitais no celular e no computador, mas que não seguiu em sua área de graduação por não conhecer nenhum aplicativo que possibilite o acesso ao conteúdo de estatística. Heverton trabalha na biblioteca da instituição e conhece várias pessoas que tem uma história similar a dele, estudantes e servidores da UFU que utilizam os aplicativos para auxiliar nas atividades cotidianas.
É claro que a inclusão digital permite aos portadores de deficiência visual uma melhora significativa em sua qualidade de vida, mas também possibilita sua inserção no mercado de trabalho, além de promover maior independência para realizar suas atividades. Estas pessoas têm direitos assim como qualquer cidadão normovisual, por isso é tão importante divulgar sobre a existência dessas tecnologias.
“Quando perdi a visão eu não sabia da existência deste tipo de tecnologia, por isso pensei que não teria mais acesso à leitura e às tecnologias da forma que eu tenho hoje” Heverton afirma e conta ainda que tem facilidade com as redes sociais, “hoje, pra mim, é super tranquilo, por isso muita gente no Facebook e no Instagram duvidam que eu sou cego, porque apresento total independência”, conclui.
Comments