top of page

Desmatamento e queimadas afetam clima no cerrado

  • Foto do escritor: Senso Incomum
    Senso Incomum
  • 13 de nov. de 2019
  • 5 min de leitura

Atualizado: 22 de nov. de 2021

Laboratório de climatologia da UFU acompanha as mudanças climáticas na região, apesar de corte em investimentos


Por Henrique Rodrigues


ree
Área de cerrado que sofreu com queimada em 2019. Foto: Vitor Bueno

A tensão internacional que surgiu no Brasil nos últimos meses fez com que os olhares do mundo se voltassem para o clima. As queimadas que se alastraram na Amazônia, acompanhadas do crescente índice de desmatamento, têm provocado alterações climáticas em todo o país e revelaram um descomprometimento político com o combate ao aquecimento global.


Na cidade de Uberlândia, as alterações no clima têm provocado chuvas desreguladas, aumento da temperatura e umidade do ar em estágio crítico, o que pode ser justificado pela alta emissão de gases poluentes. Em 2018, o dia mais quente de Uberlândia, 24 de setembro, foi na primavera, e registrou temperatura de 35,1° e umidade relativa do ar com mínima de 15%. Já em 2019, esse dia se passou no inverno, 11 de setembro, com a umidade relativa do ar mais baixa, de 11% e com os termômetros marcando 35,7°, segundo dados registrados pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).


Ainda que as pesquisas apontem que as causas das variações climáticas sejam as ações humanas, a política e a economia no Brasil e no mundo tendem a negar essa responsabilidade. O aquecimento global e os seus efeitos foram alvos de contestação pelo Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante viagem à Berlim, no início do mês de outubro, quando questionou a parcela de contribuição humana nesse fenômeno. Esse comportamento leva à perda de credibilidade da pesquisa, além de contribuir para que não sejam colocadas em prática medidas necessárias na reversão dos danos das ações humanas à natureza.


A Universidade Federal de Uberlândia (UFU) é responsável na região por realizar essas pesquisas que investigam o clima. A instituição conta com um setor que realiza, regularmente, o acompanhamento meteorológico da cidade e arredores - o Laboratório de Climatologia e Recursos Hídricos (LCRH). O propósito do LCRH é compilar as informações coletadas e torná-las mais acessíveis à população.


O colaborador do LCRH, Eduardo Petrucci, explica que o desequilíbrio das chuvas, por exemplo, é um grave problema que impacta a cidade. “Percebemos que houve uma alteração na concentração de dias com chuva, causando chuvas mais intensas, desastres ambientais, enchentes, destelhamento de casas e até mortes diretas”, revela. Os meses de dezembro a janeiro representam o período em que a cidade possui a maior quantidade de precipitação e, também, quando abastece os reservatórios para passar o período de estiagem. Porém, com essa desregulagem, a quantidade de chuva esperada ao longo dos meses ocorre em poucos dias.


Além disso, a seca é outro fator que merece atenção. O agricultor familiar de Uberlândia, José Rubens Laureano, conta como a sua produção tem sido prejudicada. "Parece que a seca piorou bastante. Ela está mais prolongada, mais intensa, as plantas sentem mais e o consumo de água, para quem trabalha com hortaliças, triplica”. Laureano alega perceber sinais de desmatamento no entorno de sua plantação. “Com o desmatamento, a gente sente maior intensidade de calor, de vento e desequilíbrio na frequência de chuva, afetando diretamente a nossa produção", afirma o adepto da prática agroflorestal.


O doutorando em Geografia, com ênfase em climatologia e recursos hídricos, Samuel Alves, aponta que o aumento das temperaturas, por sua vez, pode estar relacionado às queimadas, já que liberam gases e partículas em suspensão no ar e transformam a cobertura vegetal do solo. “Caso o solo seja utilizado para a plantação de cana, como ocorre em massa na região de Uberlândia, o balanço de radiação irá ser alterado e as temperaturas irão subir”, explica o pesquisador.


Mesmo que algumas queimadas ocorram de forma natural, há ocorrências provocadas com objetivo econômico, como a criação de pastos bovinos, por exemplo. De acordo com os principais jornais locais, o Corpo de Bombeiros da cidade registrou um aumento no número de incêndios no primeiro quadrimestre do ano, em relação aos anos de 2017 e 2018. Até abril deste ano, foram registradas 127 queimadas na cidade.


Diante do aumento do período de estiagem em Uberlândia, e a consequente baixa umidade do ar, doenças crônicas, que possuem longa duração e podem persistir durante a vida, se agravaram na população. A médica da UAI Pampulha, Izabela Porto Ferreira, comenta sobre o cenário: "Os casos de asma se exacerbaram e os sintomas agudos ficaram mais frequentes. Também notamos um aumento da incidência de pneumonia nos pacientes, o que é um processo grave”. Sobre doenças consequentes da variação climática, Ferreira completa: “Não percebemos somente problemas respiratórios, como também vemos muita conjuntivite causada pelo tempo seco, principalmente alérgica”.


Os problemas respiratórios, como asma, bronquite, rinite e sinusite, tendem a piorar nos meses mais secos da região. No entanto, as mudanças climáticas provocaram a redução dos dias de chuva, impossibilitando o aumento da umidade do ar e a dispersão da poluição, gerada pela queima de combustíveis fósseis.


Neste contexto climático, Eduardo Petrucci, do LCRH, afirma que é necessário desenvolver mais pesquisas. “Não podemos falar que há mudança no clima de Uberlândia sem estudos a longo prazo. Porém, no último quinquênio, entre 2010 e 2015, observamos a concentração dos maiores extremos de temperatura em Uberlândia, representando uma alteração no padrão do comportamento das variáveis”.


Climatologia


O LCRH coleta os dados da Estação Meteorológica do Inmet, localizada no campus Santa Mônica, e trabalha as estatísticas. Anomalias, comparações anuais de variações dos ventos, das chuvas e das temperaturas da cidade são disponibilizadas em forma de mapas e gráficos no portal.


ree
Heliógrafo, aparelho utilizado para a observação fotográfica do sol. Ao fundo, Eduardo Petrucci. Foto: Vitor Bueno

O trabalho realizado no estudo das variáveis climáticas pode auxiliar na proposição de políticas públicas para o uso consciente dos recursos naturais e para a prevenção de doenças. Esse estudo é também fundamental para a manutenção de serviços básicos para a comunidade, como a aviação e a agricultura, além de afetar a qualidade de vida dos habitantes.


Petrucci revela que, apesar da importância das pesquisas e levantamentos do laboratório para a sociedade, os cortes de orçamento, impostos pelo governo federal no início do ano e desfeitos recentemente, colocaram em risco a manutenção dos trabalhos. “Um aluno não se mantém no laboratório sem bolsa. Nós temos contas a pagar. Então, muitos deixaram de vir, para buscar um trabalho remunerado”, descreve o bolsista de doutorado pela CAPES.


Embora o trabalho desenvolvido pela UFU seja indispensável para compreender as mudanças climáticas e seus impactos no cotidiano, essa medida de contingenciamento revela descaso com a pesquisa e gera preocupação, visto que, se interrompido, a ausência desse serviço causará prejuízos imensuráveis para a cidade.

Riqueza ameaçada


O Cerrado possui grande biodiversidade e potencial aquífero, uma vez que concentra as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul (Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata). Contudo, é o bioma com a menor porcentagem de áreas sobre proteção integral do país, segundo informações do Ministério do Meio Ambiente.

Comments


world-map-stencil-large-simple-design-te

© 2020/2 SensoINcomum

Website do jornal-laboratório do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Uberlândia.

Interface original desenvolvida pelos alunos Eric Borges, Gabriel Souza, Gabriela de Carvalho, Lucas Ribeiro e Sophia Assunção para a disciplina de Projeto Interdisciplinar em Comunicação III.

Interface atual desenvolvida pelo prof. Dr. Nuno Manna, o técnico de laboratório Ricardo Ferreira de Carvalho e a aluna Ítana Santos.

bottom of page