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Violência obstétrica: uma luta de gênero recente no Brasil

Em Uberlândia, o HC-UFU implementa projetos que diminuem a prática de maus-tratos e procedimentos desnecessários durante o puerpério


Por Camilla Pimentel


Em dezembro de 2021 a influenciado digital Shantal Verdelho descobriu que foi vítima de violência obstétrica durante o parto da filha mais nova, Domênica, após assistir ao vídeo do parto no qual o médico obstetra, Renato Kalil, dizia: “Porra, faz força. Filha da mãe, ela não faz força direito. Viadinha. Que ódio. Não se mexe, porra...”. Além de expor partes intimas da mulher para o marido e terceiros. O acontecimento ganhou proporção após áudios íntimos da blogueira, nos quais comentava sobre o ocorrido, serem divulgados.


A violência obstétrica atinge 30% das mulheres atendidas em hospitais privados e 45% das atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com o levantamento Nascer no Brasil, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em 2012. Essa violência de gênero é caracterizada pela perda da autonomia da gestante sobre seu próprio corpo, elas são tratadas como objeto de intervenção profissional devido às relações de hierarquia entre profissional e paciente envolvendo maus tratos físicos, verbais, psicológicos e qualquer procedimento desnecessário que cause prejuízo para a paciente durante o período perinatal.


Ao descobrir a gravidez, a Organização Mundial da Saúde recomenda que as gestantes tenham no mínimo 6 consultas no pré-natal, além de terem alguns direitos garantidos pela legislação brasileira, como a lei 9.363/96 que garante atendimento pré-natal e assistência ao parto, puerpério e ao neonato. Ademais, a lei 11.108/05 garante a presença de um acompanhante durante o parto e pós-parto imediato e a lei 11.634/07 afirma que toda gestante tem direito ao conhecimento e a vinculação à maternidade onde receberá assistência. Entretanto, na legislação não há explicito o termo “violência obstétrica”.


Em 1993, a luta por essa violência de gênero deu início com os impulsos do movimento feminista na fundação da organização da sociedade civil denominada ReHuNa (Rede pela Humanização do Parto e Nascimento) que atua, até os dias atuais, em forma de rede de associadas em todo Brasil. O objetivo principal é a divulgação e assistência dos cuidados perinatais com base em evidências científicas. Mas, apenas em 2007 que o termo “violência obstétrica” passou a ser utilizado no país, com seus conteúdos e circunstâncias associadas ainda permanecendo em grande invisibilidade. O conhecimento por essa violência é algo muito recente no país.


Foto: Banco de imagens do Canva

Em 2019, o Ministério da Saúde considerou que o termo “violência obstétrica” têm conotação inadequada, não agrega valor e prejudica a busca do cuidado humanizado na gestação, parto e puerpério. Ele acredita que tanto o profissional da saúde, quanto o de outras áreas, não tem a intencionalidade de causar o dano. Atitude essa que inviabiliza a luta feminina das gestantes por melhores cuidados.


No Estado de Mina Gerais, foi criado em 2012 o projeto “Mães de Minas”, que tem como objetivo garantir a saúde da gestante da vida dos novos mineiros através da garantia de uma assistência, monitoramento pelo Call Center 155 e proteção social para gestantes e crianças de risco.


Na cidade de Uberlândia, a lei 12.314 garante que maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares das redes públicas e privadas permitam a presença de um acompanhante e doulas durante todo o período do trabalho de parto e pós-parto imediato. Além disso, a Secretaria Municipal da Saúde de Uberlândia desenvolve o Projeto de Estímulo ao Parto Normal, no qual as gestantes tomam ciência de todas as etapas da gestação.


No Hospital de Clínicas de Uberlândia da Universidade Federal de Uberlândia (HCU-UFU) são realizados dois projetos vinculados ao Ministério da Saúde, o “Parto Adequado”, que promove valorizar a execução do parto normal e reduzir o percentual de cesarianas desnecessárias, e o “Ápice On”. De acordo com o estudo realizado pela estudante de enfermagem da universidade, Laryssa Martins Gomes, “Violência Obstétrica: Perspectiva de puérperas atendidas em um Hospital universitário – HCU-UFU”, ao entrevistar 46 puérperas percebeu-se que a reclamação foi no período antes do parto, no qual queixaram-se da demora para o início do acompanhamento médico. Em relação ao parto e pós-parto, houve muitos elogios e ações dos profissionais da saúde melhores do que as pacientes imaginavam, o que comprova a eficácia dos projetos adotados pelo Hospital.


Mesmo existindo projetos, grupos e algumas leis que auxiliem no combate à violência obstétrica, o reconhecimento e a luta pela criminalização dos profissionais que a cometem é recente no país. Após a vítima reconhecer o crime, o ideal é que denuncie na Secretaria de Saúde do seu Município, no caso de Uberlândia através dos telefones 0800-940-1480 ou (34) 3256-3800 ou presencialmente na Av. Ortízio Borges, 196, bairro Santa Mônica – Sala 103 – 1.º Piso. Em caso de ser beneficiária de plano de saúde, a denúncia é através da ouvidoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Este procedimento é importante para a justiça promover reparação de danos estéticos, materiais e morais.


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